segunda-feira, 2 de julho de 2012

Mais um fragmento do livro Ecologia e Criatividade

Seja curioso. Mais um fragmento do livro Ecologia e criatividade

Sentido




Palavra

ensandecida

ensandevida

incendiada

Palavra

encarnada

enfogueada

enfogareirada

Palavra

fornalhada

fundiada

fundida

Palavra

solta

salta

some



...e eu no encalço

buscando apreender

o sentido do que não

quer

Ser dito

pode

Palavra

queima como uma bola de foto

o juízo da gente



Ao chegar ao ponto mais alto da Cordilheira dosAndes, O Illimani, mais de 6.000 metros acima do nível do mar, em La Paz, Bolívia, no cenário de céu nublado e brancas neves, sentei em um bloco de pedras, à beira do despenhadeiro, e cantarolei baixinho:

“Eu é que não me sento no trono de um apartamento, com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar...”, música do maluco beleza Raul Seixas.

Estava ali em busca de algo. Não sabia exatamente o quê, mas buscava. O Curso de História, na Federal do Acre, ficara para trás. Queria, na verdade, experimentar a história dos Incas, o povo que dominou por séculos uma grande parte da América do Sul, e que deixou a sua marca na cultura da gente andina, com suas roupas coloridas,os cabelos lisos e negros, a sua cultura.

A próxima parada seria a cidade de Cusco, no Peru, onde iria conhecer Machu Pichu, a cidade perdida da civilização Inca. Em cada contato uma lição. Desde cedo carrego o hábito de ouvir os mais velhos. Os meus amigos íntimos sempre foram os mais velhos. Com o bom ouvido, a pergunta pronta, caderno, caneta e máquina fotográfica, fiz uma grande viagem.

Na infância o menino dos grandes olhos tornou-se um curioso voraz. Com poucos livros em casa, começou a ler qualquer coisa que estivesse ao alcance. Nos primeiros anos ficou íntimo de Walt Disney e dos seus personagens. Para ler as histórias, fazia qualquer coisa: trabalhava de graça, pegava emprestado, trocava por roupas e, muito raramente, comprava. Depois avançou para Texas, Conan, Homem Aranha, Capitão América, Fantasma, Zorro e Batman, entre outros. Concentrado na leitura, após conseguir um livro, caminhava, entrava no ônibus, atravessava a rua e subia escadas sem tirar os olhos das páginas.

Por um tempo ele adotou os livros de bolso de faroeste, do tipo chumbo grosso, chumbo quente, onde a bala zumbia a cada linha, no cenário do oeste americano. Foi vendedor de fotonovelas usadas, quando levava as revistas para ler em casa. As revistas eram recomendadas para garotas. Escabreado, virou a página e deixou as fotonovelas de lado. À época o seu sonho era conseguir uma banca de livros para trabalhar, onde poderia ler as publicações de graça.Através do Clube dos Livros, conseguiu comprar alguns exemplares por correspondência.

Vale destacar: Eram os deuses astronautas? de Erich Von Daniken, um curioso de marca maior, que levantou a possibilidade das antigas civilizações terem sido criadas por civilizações do espaço que aqui aportaram com suas naves, muitos anos atrás.Talvez a culpa por estar ali, sentado na pedra, no alto da Cordilheira dos Andes, fosse desse cara. No caminho, passei pelo Pantanal Matogrossense, no Trem do Pantanal, cantarolando:

“Enquanto este velho trem, atravessa o pantanal, o povo lá em casa espera que eu mande um postal” (Almir Sater). Sim, eu embarquei no Trem da Morte. Através dele cheguei ao Illimani, em La Paz.

Como o novelo da memória não tem fim, cada fio engata outro, desde novo peguei o mal da insônia. Passava horas acordado, tentando pegar uma nesga de sono. Depois,aprendi a caçar e juntar palavras. Enquanto os outros dormiam o sono dos justos, eu virava na rede, no encalço,buscando apreender o sentido do que não quer ou pode ser dito.

Andei por aí, fazendo perguntas, fotografando e juntando história. Por fim, acabei jornalista perguntador. Agora, vivo profissionalmente juntando letras e perguntando como, onde por que e para que. Sou, então, um curioso profissional.


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